A ONU anunciou ontem que o governo haitiano deu por encerrada a etapa de busca e resgate de sobreviventes do terremoto do último dia 12. Porém, o governo do Haiti negou ter dado ordem para o encerramento. "O presidente não mandou encerrar as buscas. Elas continuam", disse à Folha Volcy Assad, porta-voz de René Préval.
O anúncio surpreendeu porque na véspera duas pessoas --uma mulher de 84 anos e um homem de 21-- foram resgatados com vida. Ontem, enquanto governo e ONU divergiam, um rapaz de 23 anos foi salvo dos escombros de um mercado de Porto Príncipe por equipes francesas.
Rismond Exantus disse que sobreviveu comendo biscoitos e bebendo Coca-Cola e cerveja.
Segundo Elisabeth Byrs, porta-voz da Ocha, o braço da ONU para assuntos humanitários, a "dolorosa" decisão de interromper as buscas foi tomada por orientação de especialistas. Entidades vinham alertando que o número de mortos poderia ser ainda maior caso os feridos não recebessem atenção médica adequada a tempo.
Ela disse que a maior parte das equipes de busca e resgate está agora deixando o país. Devem ficar apenas as chamadas "equipes leves", sem equipamento pesado.
"Isso não significa que vamos encerrar totalmente as buscas já. Ainda há equipes em campo, procurando, porque milagres acontecem às vezes.
Mas passo a passo vamos mudar o foco para o tratamento dos sobreviventes", disse Byrs à Folha. E reforçou: "Não foi uma decisão nossa, mas deles [governo haitiano]".
Relatório da Ocha divulgado ontem aponta que mais de 130 mil pessoas já se aproveitaram do transporte gratuito oferecido pelo governo e se mudaram da capital para as cidades do norte e sudoeste do país.
O organismo estima que o número de pessoas que estão deixando as áreas urbanas em direção à zona rural possa atingir 1 milhão, o que deve aumentar a pressão sobre comunidades já vulneráveis.
A contagem oficial de mortos já passa dos 112 mil, segundo o ministro do Interior do Haiti.
Estupros
Após viverem o terror de perderem parentes, amigos e suas casas no terremoto, haitianos desabrigados estão preocupados com estupros em acampamentos não oficiais montados em praticamente toda a capital.
Militares da Minustah, a missão de paz da ONU no Haiti, já registraram pelo menos três desses casos, todos na favela de Bel Air. Contudo, o número pode ser maior, uma vez que os índices de notificação desse tipo de crime são muito baixos.
"Estou muito preocupado. Meus três filhos e a minha mulher estão dormindo na rua enquanto eu não acabo de construir uma casa nova. Aqui em Cité Soleil [favela na capital] já estupraram sete mulheres", disse o comerciante Vital Noel, 26, que tentava fazer um barraco com placas de metal e estacas de madeira. Historicamente, a maior parte dos estupros em Porto Príncipe é atribuída pela ONU e pela Igreja Católica à ação de membros de gangues armadas.
As autoridades haitianas calculam que pelo menos 3.000 detentos -muitos deles membros de gangues- ganharam as ruas depois que a Penitenciária Nacional ruiu com o terremoto.
Na fuga, os criminosos ainda levaram armas da Polícia Nacional do Haiti.
Colaboraram FabioZanini e Luís Kawaguti, em Porto Príncipe, e Luciana Coelho, em Genebra; com agências internacionais
Fonte: Folha On-line
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